Alucinação I


Alucinação I


Pára!

As árvores balouçam ao vento

São verde sem esperança

Risos de criança

Agora não! Está frio

Quero chá e cobertor

Uma história de amor?

Sem passarolas e dedos sujos

Conventos que esmagam homens.

Choveu. Ideias de água

Ninguém te ouve, não vale a pena

Criminalidade? É estar aqui

Suspiro... pensa, pensa

Nem penses. Dói. O coração

Na garganta

A vida é uma viagem de barco

Sigo em terra. Enjoada

Chega a voz para falar

Não chega para gritar

Não saber. Ha! Ha!

Não sabes...

O chão não deve ser azul

O céu é azul

Tanto pensas e só disparates!

Sonhos alucinados

Foi como se não tivesses dormido

Não me lembro, não me lembro

Alguém, não sei quem

Azul que também é a caneta

Mas verde é a vontade

Não inexperiente, maçã

Esperançosa, bandeira

E alma não patriota

Fugaz gosto de se ser aqui

Não vás por aí!

Vou, vou sim

Já lá estou...

Não sabes escrever

Olha quem fala!

E o candeeiro de rua não se move

Apagado ser, escuro

Brilha mais a prata

Inútil nos meus dedos

Nos teus braços, nas tuas mãos

Nas gargantas sãs

A minha não

E os óculos não servem para ver

Somos cegos, não sabes

O mar que não vê o céu

Não o encontra, não existe

É tudo igual, tudo azul

Dá-me um lenço

Também quero roubar vontades

Não vejo por dentro

De que cor seria a minha alma?

Ela não se vê. Mas ela vê!

Triste consciência. Coincidência?

Não sabes do que falas

E aquela não sabe que não ouvimos

Eu não oiço. Palavras leva-as o vento

Não o há dentro da sala

Há um espírito louco

Dedos velozes, escrita deficiente

Ideias inacabadas, falhadas...

E tentativa de poema sem fim

O que queres de mim?

Ir para casa. Chá de mel.

Almoço pede o estômago

Que horas são?

Oh, cala-te!

O céu está cinzento

Talvez o veja o mar

Não podemos pintar tudo azul

Que cor é essa, afinal?

A cor detrás das nuvens

E qual a cor das nuvens?

Não interrompas

Não leias. Chega para lá!

Deixa a louca escrever

Já vamos no contrario das linhas

De cabeça para baixo

Aqui não há força da gravidade

Grave é estar aqui

E perder o propósito do aqui

Ouvir? Não me contes histórias

Não reais, por favor

Fala lá para quem te ouve

Eu oiço outra voz

Que também não se cala

Acordou assim, impaciente

Sem sentido, desvairada

Entrou-me vento na cabeça

A água que molhou os cabelos

Não posso ficar doente

Não se pode ser o que já se é

Assim como não se pode

Pintar o céu de azul

Mesmo que hoje não seja azul

Mas cor de nada

Cortando o verde balouçante

Que dirão essas vozes?

De certo não falam de História

De Américas e dinheiros

Mercados onde se vende a alma

A troco de coisa nenhuma

A parta não vale nada

Vale mais o papel

E a tinta azul de uma caneta

Que já a vontade é preta!

E bonito é cantar

Mas aqui já não há voz

Nem risos embalados

São humores encaixotados

Deu-te a luz e fechas os olhos

Também não queres ver

Mas o Sol hoje é História

E História é coisa de Inverno

Solução para a falta de Sol

E para o abraço da Lua

Embaraço dos apaixonados

Aqui só ficcionários

Bonequinhos de papel

Constrói e destrói

Dá à luz e dá à escuridão

Nascem e morrem

Pelo capricho da mão

E fim nunca é boa palavra

Nem sábia decisão

É antes necessidade

E alívio do coração

Que sempre bate mesmo cansado

Que cansaço não importa a ninguém

É desculpa, não é nada

É vida amargurada

E prazeres que ficam por dar

Pálpebras baixas e aflição

Tossidela de anunciação

E roda o mundo vala adentro

Não se perde nada de nós

Que o lixo é todo o mesmo

E o céu continua não azul

Calado e voador

Chegam mãos para o tocar

E ele foge temeroso

Rindo-se desta insanidade

Memoria de eternidade


Raquel Martinez Neves

14-Abr-10

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